Por Claudia Antunes
O Congresso Nacional está prestes a votar um projeto de lei que pode alterar de forma significativa as regras do arcabouço fiscal, abrindo espaço para gastos públicos fora dos limites estabelecidos pelo atual regime de controle das contas. A proposta, já aprovada pela Câmara dos Deputados e agora em análise no Senado, prevê que despesas financiadas com recursos de empréstimos internacionais fiquem fora do teto de gastos definido pelo arcabouço.
Na prática, a medida cria uma brecha que permite ao governo ampliar investimentos sem que esses valores sejam contabilizados dentro das restrições fiscais. A mudança é vista com preocupação por economistas e analistas do mercado, que alertam para o risco de desequilíbrio nas contas públicas e para o aumento da dependência de crédito externo.
De acordo com o texto, as despesas custeadas por operações de crédito contratadas com instituições financeiras internacionais — como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD, conhecido como Banco dos Brics) — não seriam consideradas no cálculo do limite de crescimento das despesas primárias.
Risco de deterioração fiscal
Especialistas afirmam que, embora o objetivo do projeto seja ampliar a capacidade de investimento do país, principalmente em áreas como infraestrutura, meio ambiente e programas sociais, a exclusão desses gastos do arcabouço fiscal pode comprometer a credibilidade da política econômica.
“O problema é que a proposta enfraquece a âncora fiscal criada para dar previsibilidade às contas públicas. Se o governo puder gastar indefinidamente com base em empréstimos, o arcabouço perde seu poder de controle”, explica o economista Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central.
A medida também pode gerar impacto na dívida externa, que tende a crescer caso o governo amplie a contratação de financiamentos internacionais. “O Brasil já vive um cenário de pressão fiscal, e o aumento da dívida em moeda estrangeira adiciona risco cambial. É um passo perigoso”, avalia a economista Elena Landau.
Argumentos do governo e do Congresso
Parlamentares que apoiam a proposta argumentam que a exclusão dos empréstimos internacionais do teto de gastos trará mais flexibilidade para o país captar recursos voltados a investimentos estratégicos. O relator do projeto na Câmara, deputado federal Vinicius Carvalho (Republicanos-SP), defendeu que o texto “moderniza o arcabouço ao permitir o uso de créditos externos em obras e programas que geram retorno social e econômico”.
O governo, por sua vez, tem adotado um discurso cauteloso. Embora o Ministério da Fazenda reconheça a importância dos investimentos externos, técnicos da pasta alertam que a medida pode fragilizar o compromisso com o equilíbrio fiscal. Segundo fontes da equipe econômica, o tema ainda está em discussão interna, e o ministro Fernando Haddad pretende sugerir ajustes no texto caso o Senado o aprove sem modificações.
Votação decisiva no Senado
A expectativa é que o projeto seja votado nas próximas semanas. Caso aprovado, seguirá para sanção presidencial. Se entrar em vigor como está, o governo poderá realizar despesas bilionárias fora dos limites do arcabouço — o que, segundo analistas, pode dificultar o cumprimento das metas de resultado primário estabelecidas para 2025.
Para o economista Alexandre Schwartsman, o cenário é de alerta: “Ao abrir exceções, o Congresso sinaliza que o compromisso com o controle fiscal é frágil. Isso pode aumentar a desconfiança dos investidores e elevar o custo do financiamento público.”
O debate em torno da proposta ocorre em um momento delicado para a política econômica brasileira, que tenta equilibrar a necessidade de crescimento com a responsabilidade fiscal. Se o projeto for aprovado, o país enfrentará o desafio de encontrar um ponto de equilíbrio entre investir mais e manter a credibilidade do novo arcabouço — um equilíbrio que, segundo especialistas, será difícil de sustentar caso as exceções se tornem regra.









