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Trump, mas e o Jair?

Por Claudia antunes

Nos bastidores da 80ª Assembleia Geral da ONU, um gesto chamou mais atenção do que muitos discursos: o abraço entre Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump. O encontro, inesperado até para parte dos assessores do ex-presidente norte-americano, tornou-se rapidamente um dos episódios mais comentados no mundo. Trump foi além do protocolo: declarou que “houve química” entre os dois e enfatizou que só negocia com líderes de quem realmente gosta.

O contraste entre o clima tenso no plenário e a cena descontraída nos corredores não poderia ser maior. Não se tratou apenas de um gesto pessoal, mas de uma mensagem política: em tempos de polarização global, encontros simbólicos são capazes de redesenhar percepções.

Lula, que tem buscado projetar o Brasil como mediador de consensos internacionais, aparece nesse episódio como alguém disposto ao diálogo mesmo com lideranças de perfil muito distinto. Trump, por sua vez, mostrou que sabe usar a dimensão pessoal das relações para construir pontes inesperadas. Sua frase sobre “química” ecoou como um indicativo de abertura, revelando um lado pragmático que surpreendeu até observadores experientes.

Analistas diplomáticos destacam que esse abraço pode ter efeitos além da anedota. Para o Brasil, o gesto reforça a ideia de um país que circula com desenvoltura entre diferentes polos de poder, preservando autonomia sem se fechar a oportunidades de cooperação. Trump, em tom descontraído, afirmou que “houve química” entre ele e Lula e acho frase, que soa simples, carrega significado estratégico. O presidente norte-americano há tempos aposta em personalizar suas relações políticas, e deixa claro que só respeita líderes fortes. Nesse caso, Lula aparece como um protagonista valorizado em um cenário internacional fragilizado.

O contraste entre o clima frio no auditório durante o discurso de Trump e a repercussão calorosa do encontro com Lula evidencia a força da política gestual. Na plenária, o tom duro e o distanciamento do ex-presidente não encontraram eco. Mas nos bastidores, a narrativa mudou: um abraço foi suficiente para reposicionar a cena e gerar leituras sobre um possível canal de diálogo entre Brasília e Washington.

8 pontos abordados por Lula na ONU


1. Defesa da democracia e da soberania
• Lula criticou sanções unilaterais e intervenções, dizendo que essas medidas ferem a soberania de países.
• Ele afirmou que a democracia vai além de votar: engloba redução de desigualdades, proteção dos direitos humanos básicos e respeito às instituições.
• Destacou que o Brasil condenou seu ex-presidente, Jair Bolsonaro, por tentativa de golpe — algo inédito nos 525 anos da história do país, segundo Lula — como exemplo de que não há pacificação com impunidade.


2. Críticas aos Estados Unidos e às sanções
• Ele rejeitou sanções “arbitrárias e unilaterais” aplicadas pelos EUA sem diálogo ou respeito ao processo jurídico brasileiro.
• Ressaltou que essas ações ameaçam a independência do Judiciário e a economia do Brasil.


3. Questões humanitárias e conflitos internacionais
• Lula condenou o que chamou de “genocídio em Gaza”, alertando para a situação de mulheres, crianças, vítimas civis sob os escombros — e lembrando que nada justifica essas mortes.
• Defendeu o reconhecimento da Palestina como Estado.


4. Desigualdade, pobreza e migração
• Enfatizou que pobreza e desigualdade são inimigas da democracia.
• Citou conquistas recentes do Brasil, como sair do “Mapa da Fome”.
• Fez menção à desigualdade de gênero, criticou a culpa atribuída a migrantes por problemas socioeconômicos.


5. Regulação de tecnologia / proteção de crianças e adolescentes
• Lula falou sobre os desafios das big techs: seu papel tanto positivo quanto de risco, especialmente no uso digital por jovens.
• Destacou lei brasileira recente que busca coibir a adultização precoce de crianças nas redes sociais.


6. Clima, meio ambiente e compromissos internacionais
• Propôs que o combate à mudança climática seja tratado como prioridade pela ONU.
• Defendeu que os compromissos ambientais sejam mais ambiciosos e cobrados, inclusive dos países ricos.
• Lembrou que o Brasil sediará a COP30, em Belém, e afirmou que esse será “a COP da verdade” — momento para demonstrar compromisso sério global.


7. América Latina, instabilidade regional e relações multilaterais
• Lula falou sobre crescente polarização e instabilidade na América Latina.
• Defendeu diálogo com a Venezuela e pediu que o Haiti tenha direito a um futuro sem violência.
• Também falou sobre o absurdo de Cuba figurar como país patrocinador do terrorismo; expressou preocupação com a equiparação entre criminalidade e terrorismo.


8. Valores humanistas e legado moral
• No encerramento, Lula fez referência a personalidades como Pepe Mujica e o Papa Francisco, lembrando que eles representavam valores como humanidade, solidariedade e coragem diante do ódio e do medo.
• Enfatizou a ideia de que derrotados são aqueles que “cruzam os braços” — ou seja, que não atuam.

Principais temas do discurso de Trump
1. Imigração e fechamento de fronteiras
• Trump fez forte crítica às políticas de migração e defendeu que os países devem fechar suas fronteiras e expulsar estrangeiros que considera indesejados.
• Segundo ele, o que chamou de “globalist migration agenda” (agenda globalista de migração) estaria destruindo nações.


2. Negação e crítica ao combate climático
• Um dos trechos de destaque: Trump chamou a mudança climática de “o maior embuste já cometido no mundo” (“greatest con job ever perpetrated on the world”) e reiterou seu ceticismo em relação às políticas ambientais globais.
• Ele atacou as estratégias de redução de carbono da União Europeia e alertou que países que investem em energia renovável podem sofrer impactos econômicos.


3. Críticas à ONU e ao multilateralismo
• Trump acusou o sistema multilateral de ser ineficaz. Segundo ele, a ONU escreve “cartas fortes” mas não age de fato, dando prioridade a formalidades em detrimento de ações concretas.
• Ele afirmou que, apesar de criticar, os EUA “apoiam 100%” a ONU, embora com ressalvas.
• Também ressaltou que denunciou responsabilidades passadas da ONU, criticando sua ausência em conflitos em que os EUA tentaram conduzir negociações.


4. Guerra em Gaza, reconhecimento da Palestina e libertação de reféns
• Sobre o conflito entre Israel e o Hamas, Trump pediu o fim imediato da guerra e a libertação dos reféns, vivos ou mortos.
• Ele rejeitou a ideia de reconhecer unilateralmente um Estado da Palestina, alegando que isso seria um “prêmio” para o Hamas.


5. Relações com a Europa / uso de sanções contra Rússia
• Trump criticou países europeus por continuarem comprando petróleo russo, apesar de estarem em conflito com a Rússia.
• Ele afirmou que os europeus deveriam adotar as mesmas medidas econômicas contra a Rússia que os EUA propõem para pressionar negociações.


6. Tom provocativo e forte nas declarações
• Trump disse que “seus países estão indo para o inferno” em referência à direção política de algumas nações.
• Ele também fez críticas diretas a líderes europeus, dizendo que suas políticas migratórias e ambientais são “suicidas” para o futuro dos países ocidentais.


7. Incidentes logísticos e críticas ao funcionamento da ONU
• No discurso, ele reclamou que um dos escaladores rolantes no prédio da ONU parou no meio, e que seu teleprompter não estava funcionando. Ele usou essas falhas como metáforas para criticar a estrutura da ONU.

Contexto Brasil-EUA / Brasil envolvendo Trump
1. Tarifas de 50% sobre produtos brasileiros
Trump impôs tarifas de 50% sobre importações do Brasil, justificando-as publicamente com alegações sobre o tratamento do ex-presidente Jair Bolsonaro.


2. Críticas ao julgamento de Bolsonaro / “witch hunt”
– Trump qualificou o processo contra Bolsonaro como uma “witch hunt” (uma caça às bruxas), criticando os procedimentos legais no Brasil.
– Isso foi encarado como interferência externa no sistema judiciário e político brasileiro, gerando forte reação do governo Lula.


3. Mensagem de abertura ao diálogo
Em outro momento, Trump disse que Lula poderia contatá-lo a qualquer tempo para tratar de tarifas e outras divergências.


4. “Excelente química” no encontro na ONU
Após o breve abraço/cumprimento nos bastidores da ONU, foi noticiado que Trump disse que houve “excelente química” entre ele e Lula.

Em suma, Já há uma base concreta de confronto (tarifas, sanções, retaliações) que torna improvável que o encontro de Lula e Trump mude radicalmente a relação Brasil-EUA. Porém, o gesto recente pode abrir espaço para atenuações práticas — alívio de barreiras comerciais, avanço de negociações setoriais e pequenos ajustes diplomáticos.
Se esperarmos algo mais transformador — como uma revisão completa do protecionismo americano ou mudança institucional profunda nas políticas de comércio externo —, provavelmente estaremos diante de expectativas exageradas. A diplomacia estará mais para ajustes marginais do que para ruptura ou reconciliação total.

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